Palavras, poesias, poemas, versos, sonetos, estrofes, contos, crônicas, pensamentos, devaneios...
O caminho...
Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.
Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.
Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade
Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.
Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.
Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.
É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.
Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.
Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.
É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.
Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.
Humana sou.
sábado, 31 de julho de 2010
Mãezinha
Mãe não penses em mim como alguém capaz
Saibas que me escondo atrás dos lençóis que tu lavas
Sempre, durante todos dias
Depois que tu anuncias
Tua reza diária
E vanglorias teu senhor
Num ato sereno de amor.
Mãe, tu sempre desejou
Viver por mim
Viver para mim
Para me extrair
Da dor que o mundo
Faz a gente sentir.
Mãe, precisas tomar ciência
Apregoou-lhe que não sou apta
O medo que sinto da vida me abstrai
E, assim, faz-me incapaz.
Mãe, saibas que quando saio por aí sozinha
O que queria na realidade
- Escuta essa verdade -
Era ficar em casa
Com a cabeça recostada
Em teu colo, mãezinha.
Mãe, tu que sempre ambicionou
Um sonho para eu na vida percorrer
Mãe, tu que sempre ambicionou
Uma quimera em minhas mãos despejada
Mãe, tu tens que saber
O quanto sou inadequada
Para a vida viver.
Mãe, é assim que levo
Meus dias e minhas noites
Mãe, é assim que sobrevivo
Ao medo do invisível
Ao que desconheço
Esse temeroso e imprevisível.
sexta-feira, 30 de julho de 2010
Segadura
Apenas mais um casal
Um homem e uma mulher
Sentados na beirada do sofá
Como se isso ajudasse
Tudo logo a passar
Ainda teimando em adivinhar
Qual rumo, separadamente, irão tomar.
Não dedicaram tempo à reflexão
Nenhum dos dois sabe ao certo o que aconteceu
Nenhum dos dois sabe agora qual caminho tomar
Verdadeiramente, nenhum dos dois sabe mesmo
Em qual canto se alojar.
Foi tudo repentino
Digno da impulsividade
Acolhida, com o passar dos anos, em suas vidas.
O moço por conta da perda do sentimento da moça debilitado está
A moça por conta da perda do sentimento do moço sabe o quanto sofrerá.
Ainda assim pensa cada um em sua lugar:
- Melhor assim.
Agora se faz hora
Por hora esse é o momento
Moço e moça de pé
Ensaiando o primeiro passo
Que os levará
À saída da sala de estar.
Lados opostos das calçadas seguirão.
(Como é triste ver um amor findar ).
Não mais desfrutarão
Da melodia que um dia
Coloriu cada coração.
Morre mais um casal
Um homem e uma mulher
Desfalecidos pela vaidade
Que aos anos foi incorporada
E para cada um, descaradamente,
Em primeiro plano colocada.
E para cada um, franqueadamente,
Na plena solidão privilegiada.
Morre mais um casal
Finda mais um amor
Acabou
Fez-se o término
Passou.
Equívoco
Imaginas que assim
Sofrerás no além
Vistas do que renegas
Hoje aqui e por lá também.
Não enche mais
Não espirra
Na minha face
Perdi a paciência
Pela tua maledicência
Respeito peço eu
Por ser como sou
Por ser assim
Comigo em mim
Fim.
Falsa divindade
Alguns vão além: Mesmo sem conhecer o mínimo de um ser apropria-se arbitrariamente de seus próprios valores para opinarem e, pior, darem conselhos.
Parece-me tudo muito invasivo. Soa-me tudo muito desrespeitoso. Afinal a quem cabe estabelecer direção para a vida de alguém ou lhe dizer o que pode ser melhor ou pior de vivenciar?
Costumo reparar também nas bengalas as quais a maioria das pessoas se sustenta.
Agarram-se a esperanças falsas e ilusões de uma eternidade que nunca ninguém voltou para afirmar ou constatar sua existência.
Penso eu que dessa forma o ser humano se sustenta para sobreviver à lida do dia-a-dia. Penso eu que dessa forma o ser humano equilibra seus passos para continuar sua jornada.
Triste constatação. Cada um de nós carrega uma bengala que serve de apoio com a finalidade simples de viver.
Somos mentirosos e hipócritas. Pregamos aquilo que nunca experimentamos. É assim que todos nós mediante suas pobrezas levam a vida. Porque não, então, dizer que a vida se trata de uma grande piada contada por gente alguém muito estúpido, provavelmente entupido de cachaça e que fez questão guardar para si o clamado eterno fim?
Acredito eu que esse será simples:
No final cada um de nós terá sua porção de poeira para lamber no chão.
Tonta
Sem nome
Querendo algo chupar
Talvez uma pá
De formigas, olá.
Mas sabe que é difícil
No meio tem intriga
Muita fala, muita briga.
Urrarrá.
Relato
Preciso te contar sim
Todas as noites sonho contigo
Nos meus sonhos tu já estás aqui
E eu sem saber o que fazer de mim.
Nas minhas noites apareces como és
Puro de coração, rico de formação
Não sei por que nos sonhos eu choro
Não sei por que ao acordar eu sinto uma tristeza libertina.
Ao despertar ponho-me a pensar
Naquilo que durante a noite
Passou-se comigo e contigo
Repasso cada momento
Sigo até teu quarto
E lá estás sobre tua cama
Num sono profundo de rapaz novo.
Preciso te dizer sim
Não sei o que esses sonhos significam para mim
Sei apenas que sinto uma tristeza profunda
Imensa, intensa, ferrenha, dorida.
Não quero com isso
Parecer sensível demais
A um momento que é teu
A um momento que é nosso
Quero apenas dizer
Que meu coração
Está aí com você.
Pode?
Sobe não
Quero você aqui dentro não
Pensas que arruma tudo de graça?
Pensas que arruma tudo na farsa?
Sabias que tens cara de palhaço?
Chega
Não clames mais pelo meu abraço.
Brincadeirinha
Espero você
Vem logo
Me satisfaz
Arranha minhas costas
Beija minha boca
Enrosca tuas pernas nas minhas
Depois suma
Esqueça
Foi tudo brincadeirinha
Estou nem aí
Padeça.
Bobo
Amnésia
Não vê
Enxerga não
Desfez-se do riso
Desobedeceu seu eu
Esqueceu seu endereço
Sabe não
Como voltar para casa
Estabeleceu assim
A rua para ser
Seu novo alvorecer.
Adoro
Sozinha no meu quarto
A chuva caindo lá fora
E eu penando a essa hora.
Adoro.
Menino crescido
Atrás daquele morro
Reluz um horizonte sem fim
Virou tua moradia
Teu encanto noite e dia.
Sinceramente?
Queria você agora aqui
No teu lugar
Perto de mim.
Tu crescestes
Virastes homem
Amadurecestes
E com teus próprios passos
Buscastes teus meios
Teus singulares caminhos.
Saibas que nessas andanças
Levastes contigo
Um pedaço grande
Do meu coração
Tratas de cuidar bem dele
Já que tua presença,
Por enquanto,
Não a tenho mais por aqui.
Contaminado
Abençoado pelas mãos dos sacrilégios
Ele segue exausto e isento de privilégios
Abençoado pelas mãos dos devaneios criados
Ele segue seus anseios agarrados.
Encontra-se podre
Encontra-se submerso na lama
Seu sangue tomou outra cor
Escureceu, tem a cor do horror
Essa cor indescritível
Não lhe dá folga.
Ele frágil a suporta
É ela a praga eficaz
Que amaldiçoa esse homem
Sem permitir jamais
Que ele conheça
O sabor de alguém amar
Prostrado está
Prostrado em sua praga para sempre ficará.
Infortúnio.
Desdém
sexta-feira, 23 de julho de 2010
Recomeço
Histeria
- Curioso. Você é a única pessoa que diz estar deprimida gargalhando.
- Eu tô tão em pânico.
- Curioso. Você é a única pessoa que diz estar em pânico gargalhadeando.
- Curioso digo eu. Cê não percebeu? A histeria me prendeu.
quinta-feira, 22 de julho de 2010
Merdinha
Hipocrisia
Estrela mãe
Enquanto abençoas esse pão
Faças tu com que essa união
Mergulhe numa farsa menos tardia.
Quanta hipocrisia.
Questão
Pretensão de encanto para viver
Estão paradas, prostradas, paralisadas
No mesmo canto há alguns minutos
Choram a dor de um amor perdido
Choram a dor de um amor dorido
Choram a dor de um amor desencantado.
Choram ainda a humilhação
Choram ainda a hostilidade
Choram ainda o excesso de reclamação
Que do meu peito não vazaram.
Essas lágrimas clamam por uma nova vida
Essas lágrimas clamam um pouco de alegria
Essas lágrimas clamam a feliz partida
Mesmo que agora, assim, ainda seja meio tardia.
Partida essa que irá ao encontro do senhor
Partida esa que irá ao encontro do aludido bem estar
Partida essa que irá ao encontro do não mais preterido amor
Partida essa que desafiará através das veias frias
O encanto de ainda sonhar
Olhar do menino
Sei que ao olhar-me
Despreza-me
Aborrece-se
Desencanta-se
Amargura-se
E, por fim, hostiliza-me.
Sei que quando estás frente a frente comigo
Fitas-me mas não me enxergas
Envergonhado ficas
Envergonhado estás
Nada em mim mais te aquece
Nada em mim, enquanto mãe, ainda o favorece.
Fique à vontade
Sorrias disso tudo
Afinal, essa a quem tu condenas
Não passa de uma mulher sem fé
Afinal, essa a quem tu condenas
Não passa de mais uma mulher à deriva no mundo
Sem reza, sem oração e sem prece.
quinta-feira, 15 de julho de 2010
Sábado
Se eu pudesse saída correndo
Buscava meu mundo certo certeiro
Curioso e difuso
Claro e horrendo.
Se eu pudesse pulava esse muro
Construído em vários tons
Prevalecendo o escuro escurecido
E do lado de lá eu ia morar.
Se eu pudesse desviava de mim
Buscava outro caminho, claro, sem mim
Quem sabe assim
De alegria encheria minha tarde tardia.
Posso não
Sou fraca
Sou covarde
Infame.
Posso não
Comigo não lido
Só posso então
Pedir teu perdão.
terça-feira, 13 de julho de 2010
Merda
Mentirosa.
Se você julgasse merda não exporia.
Olha tua auto-crítica.
Cínica.
Mexerico
Ontem à noite vieram me contar
Um segredo que nasceu por lá
Fiquei entusiasmada porque iria saber
O que somente alguns julgavam conhecer.
Estreei no panorama dos confiáveis
Desses a quem se pode algo secreto confiar
Sem esperar que se intrigue
Com tudo que vai ouvir.
Ouvi quietinha, ouvido direito
Nem os olhos pisquei
Ouvi quietinha, ouvido direito
Tudo ouvi nada espiei.
Agora você é que está aí
Curioso por saber
Aquilo que sei
Mas para ti
Não poderei nunca dizer
Segredo do meu ser.
sexta-feira, 9 de julho de 2010
quarta-feira, 7 de julho de 2010
Chororô
Pranto ensurdecedor
Pranto nostálgico
Pranto do horror.
Louvado seja o senhor.
terça-feira, 6 de julho de 2010
Desastre
Ainda há algo a ser dito.
Nenhum dos dois sabe ao certo o que é.
Ele está meio debilitado de tanto se questionar.
Ela se encontra nervosa por ter esperado tempo demais para tomar uma decisão.
Na cabeça os dois ruminam formas e formas de colocarem para fora o que está parado em suas gargantas.
Talvez, sei lá, falar da confusão que plantaram durante o tempo em que se amaram.
Talvez, sei lá, falar do desejo que ainda insiste em confiscar seus corpos.
Talvez, sei lá, falar dos sonhos que sonharam juntos.
Pena. Estão alojados no cárcere da falta de palavras, ou melhor, da coragem de algo dizer.
Acredito que enquanto não se apropriarem novamente de seus corações – puros - infaustos nada ensejarão.
Os dois sabem como se resumir o momento. Para isso basta apenas uma pequena palavra: - Fim. Expurgado. Definitivo.
De repente, ele, com a cabeça abaixada, emite um som frouxo:
- Julgamos.
Logo ela sussurra:
- Reconhecemos.
Baixinho ele continua:
- Fomos incivis.
Ela:
- Merecemos.
Depois dessa palavra volta-se para a cama e pega a maleta vermelha que está sob ela.
- Vou agora.
Sai pela porta da sala.
Não lhe dá a oportunidade de dizer-lhe adeus.
O adeus fica na mente. O adeus fica parado na garganta.
Ela se foi.
Enfim, o fim.
segunda-feira, 5 de julho de 2010
Declaração de Amor
Pedro Henrique tenho algo a lhe dizer
Mesmo me sentindo meio tola
Mesmo me intimidando, erroneamente, frente a ti
Sei lá porque ocorre assim
Talvez por você ter esse jeito astuto de ser.
Talvez por seres tão belo
Talvez por seres pela beleza todo composto
Carregando contigo esse formato
Tão inteligente e tão persuasivo
Agora penso que talvez fora isso
Responsável por eu ir me calando
Nesses anos que foram passando
Besteira minha, bem sei,
Besteira minha filho, timidez.
Mas agora meu querido rapaz
Não posso mais
Não dá mais
Para calar e guardar comigo
Tudo que tenho a revelar:
Diante de mim paira uma luz
Iluminando diariamente meu caminhar
Confesso com imensa paixão
Que tu és o responsável
Pelos passos que dou pelas ruas
E, eu, na minha ilusão
Vejo que tu seguras minha mão.
Sei que pode soar um peso pra ti
Mas foi contigo que aprendi
A forma verdadeira
De como, em absoluto, humana ser.
Tenho mais a confessar
Desculpa, agora não posso parar:
Sabias que quando tu eras pequenino
E me fitava com teu belo olhar escuro
Sorrindo deixando à mostra
Os dentinhos perfeitos
E as covinhas na face
Direita e esquerda
Eu as chamava de ‘buraquinho’
Ainda hoje carrega o mesmo sorriso
Ainda hoje carregas na face
Dos dois lados teus lindos buraquinhos.
Desculpa eu te falar isso
Mas eu quando era mãe novinha
Perante tanta coisa na vida que me prostrava
E sem saber direito o que fazer
Menos ainda o lado certo a escolher
Era embaixo do teu olhar
Que eu escolhia – tu me fornecias –
O descompromisso de acertar.
E eu ia lá
Fazia tudo direitinho
Acertava no caminho
Rumava direito
Caminhava pelo lado da rua
Tudo certinho
Conseguia me sentir
Uma mulher capaz
Conseguia me sentir
Uma mulher corajosa
Eu me sentia da paz.
Já na rua buscando nosso sustento
Enfrentava feras
Enfrentava feridos
Enfrentava tormentos
Ligava não porque sabia
Que de noite para mim tu sorririas.
Foste tu rapaz o responsável
Pelo crescimento dessa que a ti se declara
Mesmo receando aos teus olhos e pensamentos
Parecer piegas
Boba, diminuta
Mas sei que não
Teu coração é generoso
E carregas no teu peito compaixão.
Contigo conheci a tranqüilidade
Ao te amamentar diante da TV
Contigo aprendi a rir e sorrir
Tu sempre tinhas algo novo a dizer
Um humor apurado a declarar
Um humor apurado a comigo
E comigo e com o maninho dividir
Pra gente por pouco
Não morrer de rir.
Saibas menino que hoje
Mesmo me sentindo ainda meio envergonhada
De falar do amor que tenho por ti
É, esse amor que carrego em mim
Mesmo sendo menina crescida
Hoje encontrei coragem
Decidi botar pra fora
Nada me segurou
Claro, chegou a minha hora.
Digo-lhe rapaz
Você contribuiu para eu ser
Mais humana
Mais sensível
E fiel ao mundo real.
Dele não fujo mais
Obrigada rapaz
E nas minhas andanças
Na mais abstrata solidão
Além de carregar teu riso no peito
Carrego você por completo no coração.
Menino crescido obrigada mais uma vez
A ti ei de ser eternamente grata
Por tudo que aprendi
Por tudo que fui
Por tudo que serei.
Sei que ainda terei
Pelo caminho algo novo a aprender contigo
Será sempre assim
Só te peço que me dê
A chance de sempre dizer
O quão sou louca por ti.
Quero poder expor
A qualquer dia
A qualquer hora
Esse sentimento imenso
Meio insano, meio descompassado
Mas sincero, mesmo desregrado.
Afirmo agora para finalizar
Que esse amor rodeia o meu ar
E contribui todo dia
Para desse ar eu, mais sabiamente, aproveitar.
Desejo com propriedade
De mãe a mim concedida
Que teu caminho brilhe na luz
Que tua luz brilhe na paz
E que sejas sempre bom
Meu querido e sublime rapaz.
sexta-feira, 2 de julho de 2010
Hexa
O combinado: No primeiro tempo vocês fodem e no segundo tempo são fudidos.
Dá-lhe Argentina!
quinta-feira, 1 de julho de 2010
Menino
Quantos anos você tem?
Mentira. Não dá pra acreditar
Você tem cara de moleque
Uns dezesseis, talvez dezessete.
Fala sério
Não mente que é feio
Tá bom vou pensar
Mas antes me mostra teu RG
Quero ver – você sabe - pra crer
Nossa como você tá bonito nessa foto
Tolice o que eu disse
Você é bonito
Reparou que teus olhos claros
Contrapõem-se ao vermelho da tua boca
Faça-me um favor:
- Diga, garoto, pra tua mãe
Que ela está de parabéns
Pelo menino que tem.
Transtorno
Sonhei um sonho
Noturno
Lento
Profundo
Gostoso
De ser sonhado.
Nele vi Isabela
Fazendo jus ao seu nome claro
A face reluzindo ao ar.
Depois avistei Maristela
Algo incomum aconteceu,
Foi Joana quem eu cumprimentei.
Em seguida vi Franciscana
Atravessando a calçada escura
Alto gritei: Olá dona.
Quando avistei Ana
O olhão azul a brilhar
Vi neles minha sombra
Agradeci e tomei rumo.
No bar da esquina
Foi com Fabiana que conversei
Danada, conheço-a bem
Querendo me fazer crer
Que ainda não tem ninguém.
Atrás da praça esverdeada
Nena compareceu
Acenou sorridente
O sorriso de sempre
E voltou para casa
Confidenciou-me que aprendera
Uma nova receita
E ia por em prática
Para a família meio afoita.
Sonhando caminhei um pouco mais
E não é que dei de cara com um belo rapaz?
Veio ao meu encontro falou oi
Eu tonta não soube o que fazer.
Gerri apareceu
Contou do seu novo dever
Resmungou um pouco
A falta de tempo pra tudo
E foi embora antes de eu
Sequer mencionar oi.
João passou por mim
Sorriso escancarado
Tascou um beijo na minha cara
E foi curtir uma farra.
Pedro cruzou com pressa
A calçada esburacada
Cumprimentou-me com leveza
E de costas acenou
Deu para escutar
O estalo do beijo no ar.
De repente sem esperar
Sebastião resolveu
De novo e como sempre
Ficar a me azarar.
Lucca veio logo ao meu encontro
E gentil como sempre
Arrancou-me daquela situação
Adeus azaração.
Trazia embaixo do braço
Um buquê de rosas brancas
Pediu que eu entregasse
À sua mãe na quitanda.
- Tá bom menino, tá bom.
Agora vou embora.
Olvidado
Experimentou o sabor do desgosto
Ao se olhar no espelho do armarinho do banheiro
Raivosamente se pôs quando deu de cara consigo
Era aquilo de homem que ali para ele se apresentou.
Uma nova figura
Uma nova personagem
Outrora esquecida
Tanto por ele quanto pelos demais
Que habitaram em determinado período
Sua vida e preencheram seu coração.
Com pesar saboreou a saudade
Recordando caminhos cruzados
Recordando apoquentadas personalidades
Chorou
A face banhou
Reconheceu que aqueles a quem tinha apreço
Não lhe retribuíram
Nem retribuiriam
Sequer compaixão qualquer.
Homem adulto
Homem acovardado
Homem descoberto
Homem desesperado
Foi nisso que se tornou.
Homem adulto
Homem acovardado
Homem descoberto
Homem desalentado
Foi nisso que se fincou.
Ignorante teima em remar
Contra a sorte que não virá
Espera ele assim
Quem sabe encontrar
Piedade e alguém a lhe indicar.
Quem sabe um novo rumo
Quem sabe um novo norte
Quem sabe a fuga
Da vida
E da morte.
Talvez nesse novo lugar
Possa a cabeça adormecer
Talvez nesse novo lugar
Possa a cabeça repousar.
Iludido espera na desilusão
Que restou lá no fundo
Do seu estranho coração
Atenção ninguém lhe dará mais
Há de percorrer a estrada
Impedido por sua alma
De olhar para trás.
Adstrito
Alto
Suntuoso
Delgado
Rosto delineado
Por finos traços contornado.
Um caminhar que remete à flutuação
Mesmo com a postura meio envergada
Não desfavorece sua nata elegância
Mesmo coberto por trapos
Há que se afirmar com prontidão:
É um belo homem
Fascinante
Charmoso
Harmônico
Harmonioso.
Atrás somente da pensada
Talvez merecida gratidão
Afinal, oras um dia ele se atreveu
E alto proclamou:
Bradou por luz
Bradou por paz
Bradou pelo amor.
Bradou só
Em absoluto
Ninguém o escutou.
Não adianta mais
Meu prezado rapaz
Nem mesmo tua aparência formosa
Será capaz de fazer
Os olhares a ti se voltarem.
Toma ciência
Bem sabes que fostes doado
A miséria de um amor parco
Amor esse em tua pele, com tinta negra, tatuado.
Ainda assim, até um pouco mais ignorado
Constatou – pobre - os olhos lacrimejados
Que do teu clamar ninguém se apeteceu
Ainda assim, um pouco mais ignorado
Constatou – pobre - os olhos marejados
Que teu clamar pé fincou
Teu clamar posto de lado
Ninguém dele se apropriou.
Escolhe um canto e chora
Chora enquanto ainda há pranto
Chora enquanto ainda há tempo
De botar para fora
E fazer respingar na tua face bonita
Só mais um efêmero prantear.
E vives com isso a se questionar
Se esse erro é, foi ou um dia será
Merecidamente teu.
Trouxa
Nasce em algum lugar
Ninguém sabe dizer onde fica ou onde é
O que pensar de onde localizado está?
A doce palavra que responde pelo nome de ilusão
Acalentando e sustentando pobre a pobre
Um a um coração.
Seu ofício é propício em aguçar
Seu ofício é propício em fazer imaginar
Dia após dia
Noite varando noite
Cada passo que se dará
À margem, à frente
A beira estreita da tua casa
Ou o alojamento habitado
Pelo teu sôfrego e ambicionado
Ambiente do tempo e da mente.
Cá entre nós – ligo não -
Digo de cara limpa, por isso digo,
Soarei dura - estou nem aí pra você –
Que teima em saborear
O gosto dessa quimera
Que dia a dia, também,
Crua ela se apodera
De ti e de mim
Sem sequer pestanejar
O que dizer quando seu desejo
É só fabricar formas e meios de incitar
Algo que sabemos – lá na frente –
Nunca, nem pense ou tente,
Você virá a degustar.
Trouxa.