O caminho...

Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.


Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.

Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade

Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.

Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.

Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.

É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.

Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.

Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.

É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.

Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.

Humana sou.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Luiza Laura e Laurinda



Encontro-me com ela
Pequeno começo estabeleço
Um momento a sós – só nosso -
Junto à esquina daquele farol
Brigadeiro com Consolação.

" Tamanha indiscrição a sua
Meta-se com tua vida
Prurida fantasia modesta e fria
Pequena prolongada
Nada refinada."

Bota medo, bem sei
Àqueles que ainda não foram
Correm o risco de perderem-se
Pelas vilas lidas ladainhas.

- Ignora,
Típico de gente
Bem gentinha
Quase um nada
Um nadinha.

Encontro-me com ela
Estabelecemos outro momento – só nosso -
Eu a pedir - Roga por ti
Quanto a mim, esqueça
O momento abençoado é todo teu
Trague-o

Por mim não desafies nenhum rancor
Não atormente
Nem transforme
Veste-se de seu minúsculo pudor.

Diferente do começo, lembro bem
Principiou tão curiosa quanto banal
Na cara espelhava
Transtorno ventania vendaval

-Mas é ela quem se levanta
À noite, pra fazer o mal?

- Que mal?
Por isso deixou-a assim,
Perplexa, sozinha amedrontada
Numa rua pequena encruzilhada
Maleta em punho empunhada?

Saiba, foi naquele momento
Viu-se inteira
Aos pés do chão abandonada
Diferente dos becos das tuas ruelas
Desafiando teus ecos pela goela

Alegoria de gente,
Bem gentinha
Chorando calada sozinha
Sem pensar em melhorar
Ser melhorzinha.

Nesse momento
Dói-lhe a barriga a cabeça
Suas mãos denunciam medo
Os pés estão úmidos gelados
Grudados ao lado do pequeno coração roubado.

Mas é na garganta da minha canção
Que te vejo na contramão
Diriam, tens aí uma canção vestida
Encontrada justamente pela menina desavisada
Durante sua estreita estadia.

Novo encontro estabelecem
Fez-se outro momento a sós - mais um entre nós -
Melhor se comparado aos outros
Outrora denunciados
Há até um pequeno luar na saia bem guardado.

Viu-se na tua lua esbranquiçada
De pó empoeirada
De calma acalmada
De azul bem azulada.

Fizeram-na podre sem calor
Teimosa em adormecer durante o dia
E acordar somente nas madrugadas

Recorda-te,
Em minhas mãos permeiam suas mãos vazias.
Roga perdão
- Implora ao teu coração!

Mais uma vez elas se encontram
Novo momento - outro a sós -
Duas confusas, tal como nós.

- Cuida,
Há vômito na geladeira
De pó tanta poeira

- Repara,
Recebestes um luar esbranquiçado
A ti todo doado
Enquanto não me acostumo
Eu retardo.

Sei que mereço menos do que já faz
Mas há espaço
Doa-te um pouco mais.

Com tua lua luazinha - branca esbranquiçadinha
De calor acalorada
De medo amedrontada
De branco enviesado
Eu? Louvo o preto ao cinza avivado.

Teu pequeno medo tornou-se desajustado
Transformou-se em choro desavergonhado
Chora bem
Chora calado
Choro imundo
Empoeirado.

Lá, na beira, mar estiva tua dor
Por pouco, quase nada,
Não te dou outro valor.

Por menos, fiz-me sozinha
Correndo pelas calçadas
Os pés descalços
As havaianas largadas.

Imploro teu ponto final
Abono o momento abjeto
Soubesse, juro,
Percorria contigo outro trajeto.

- Mas e dela, alguém ainda se lembra?

Perdeu-se, foi embora
Levou as sobras mal agouradas
Roga paz recebe nada
Pede amor simulam paixão

Quanto a mim penso em suicídio
Por outro lado, hei de confessar,
Por ela morreria sem nada carregar
Só assim ,entre nós, outro momento haveria.

Mas,é em teu destino que ela se faz febril...

- Agora não!
Cala
Ouve a poesia - pequeno regalo -
Atirado na sala pelo hall de entrada.

Pelas brechas ainda te vejo rodopiar
Rodopias curto bem devagar
Pena, a partir desse momento não te vejo mais
Acabou, maltratastes minha imunda paz.

Dividida fico eu como miolo de jornal
Nado na chuva desavergonhada
Procuro um caminho seco
Mas só vejo o da frente largueado

A neblina? Tempestade baixou
Abriga-me e pensa
Encara tua efêmera dor?

A mim, sei, doaria um coração embalsamado
De desapego desapegado
Não anseie galanteios, não por hora,
Esse momento é dessa senhora.

Mesmo sem alimento e sem cozinha
Ainda é de cata-vento
- Venta a vadia -
Agora, menos enjaulada

É noite, não parou de dia
- Vai menina
Descansa sossegada
Fico a espiar tuas passadas
Ouço ranger os dentes, confusa

Faço deles suave melodia
A parte que faltava
Da minha biografia não autorizada.

- Ei-lo
Está morto
Decompôs-se
Puro desgosto

Ao acordar
Levanta-te logo
Procura tua cama
Mamãe aflita cedo te chama
Em desespero há de gritar
- Levaram teu corpo
Não se sabe ainda quem.

Novamente sozinha
Procuro um outro raro e velho bem
- Ei-lo
Morto amortecido
Quieto encarecido
Feito anjo louro endiabrado.

Resta agora seu som sobre o meu
Essa, já não sou mais eu
Fiz-me alvo de ninguém.
Tornei-me refém.

- Ei-la
Está viva e embalada
Pela preguiça amparada
Despida e embebida
Coitada, rechaça.

Rezou,
Chorou,
Cremou o corpo nu
Disso tudo fez um culto.

Jaz morto,
Não alivia dor
De quem nasceu atravessado
De lado, quase um finado,
Digno como qualquer outro rejeitado.

- Espera,
Não terminei
Cuspiu no retrato da própria filha
À sua propriedade agora reduzida.

Nada mais a abala
Segue quieta perante a ida
Alcançou
Com laço laçou
Arrematou
Apoderou-se
De sua corrente sangüínea.

Como és bela,
Melhor, fez-se linda!

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