O caminho...

Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.


Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.

Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade

Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.

Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.

Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.

É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.

Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.

Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.

É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.

Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.

Humana sou.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Conto: Tem alguém aí que encara um rapto ou sequestro, bem facinho, para me salvar?

Fiquei parada quase quarenta minutos no último degrau da escada – no alto –

Bom, você sabe bem o que isso significa: Eu poderia rolar degraus abaixo e ninguém correria para me segurar.

Mas, não sei como, mantive o equilíbrio naquele salto esquizofrênico doze, naquele vestido florido pastel que mais parecia a cortina da casa da minha bisa.

Eita vida besta.

Eita vida besta mesmo.

O que a gente não faz para ver um idiota de novo, anos depois de ter tomado um fora na lata do? Yes: Idiota.

Acho que no fundo, no fundo eu só queria mesmo era observar a Solange entrando toda pomposa, rodeando o? Idiota! E, ali, na frente de todo mundo, descer a mão com os cinco dedos bem estendidos na cara do? Idiota!

Eu queria mais era ouvir um puta plaft!!!!!!!!!

Que plaft que nada.

Infeliz. Traiçoeira. Judas.

Rodopiou, rodopiou, tomou o copo do? Idiota na mão, deu uns goles e meteu-lhe um beijo. Na b o c a...

O quê? Como assim? Sua Judas Iscariotes você não prometeu que ia acabar com ele na frente de todos com traços de terrorismo oculto, fantasmas disfarçados entre os convidados e você guiando a marcha da pancadaria no? Idiota?

Prometi, mas não quero mais...

Ah, vontade de enfiar a mão na cara da? Tonha.

Problema teu. Meu fora já tomei. Espera que logo, logo ele tenha um vistoso para ti também.

E eis que ganha mais um sobrenome: Tonha. Solange Tonha da Silveira Cruz.

Bonitinho. Merecido.

Descendo os degraus, segurando no corrimão e rezando um pai nosso mental, para não cair, destilei:

Não ouse me telefonar, não ouse me chamar na rua, não ouse, sequer pensar em mim.

Covarde.

Quem? Ela ou eu que no meu fora fiquei feito um frango no cantinho calada, envergonhada, com um meio sorriso na tentativa de disfarçar o que o? Idiota estava fazendo comigo. Na verdade, estava mais era para galinha que teria o pescoço decepado.

Bom, chega. Tô fora. Vou sair daqui AGORA.

Te vejo em casa Tonha.

Maldição... isso é demais... Porquê Deus EU??? Essa Tonha além de tudo é minha irmã e vai levar o? Idiota para dormir com ela, na cama dela, na nossa casa. Ah, não, não, sim.

Eu mereço.

Apresso o passo. Passo pela porta principal quase correndo. De soslaio avisto um boteco aqui, outro ali, um bordel disfarçado aqui, uma jogatina ali e decido bravamente, parar no boteco cujo nome era ‘Merecedor’. PQP merecedor do quê?

Entro apressada e já vou gritando: Por favor alguém tem alguém aí disposto a um rapto ou um sequestre para me salvar?

Todos os olhos vermelhos de cachaça se voltaram para mim.

Tá vendo doida? Encara.

Eu preciso que alguém me sequestre. É, por favor, eu preciso que alguém faça isso por mim para me salvar de mim, entende? (Só faltou morou?)

Olha, eu mesma pago o resgate quero passar o resto da vida à base da síndrome de Estocolmo. De verdade.

Síndrome de Estocolmo.

Quem ali sabia o que era síndrome? Quem??? E Estocolmo? Quem???

Cala.

Avanço nos passos e paro na frente da porta encardida que dá para um bordel lá no fundo do Merecedor e vejo um senhor com camisa de flanela em pleno verão carioca. 

Penso comigo: É esse.

Por que esse? Ah, Idiota.

Senhor, é, sim, o senhor mesmo, por favor, qual é o seu nome?

Juarez. Juarez Ricardo Diamantino.

Nomão né seu Juarez. Seu Juarez o senhor pode me sequestrar ou raptar, levar para qualquer lugar que não seja por aqui?

Seu Juarez quase desceu o resto da pinga toda pela goela, olhou nos meus olhos, puxou-me pelo braço e saímos do Merecedor.

Andamos duas quadras. Seu Juarez mudo da silva. Eu falando até pelos cotovelos, joelhos e calcanhares... Seu Juarez se o senhor quiser pode fechar minha boca com fica colante aí eu calo a boca mesmo está? Tem problema não. Não quero lhe importunar.

E não é que de repente lembrei da? Tonha. Do? Idiota e de? Mim e desabei no choro.

Graças ao altíssimo, que deve estar em algum lugar, seu Juarez não deu um pio, só pediu baixinho para eu chorar num tom abaixo daquele. Ah?

Tá bom, sim senhor.

Viva os homens braçais que não aguentam ver mulher aos prantos, mas deixam elas prantearem e a única coisa que pedem é que não pranteiem alto.

De repente ele me puxou pelo braço, abriu a porta de uma Kombi, acho que branca, não tenho certeza, porque era de noite, tinha ferrugem, estava encardida e estava toda 
descascada do lado do passageiro na parte de fora.

Em menos de dez minutos chegamos ao seu muquifo. Home, lar, casa, quartinho, barraco, sei lá. O importante é que agora o sequestro estava concretizado.

E não é que seu Juarez, honesto pra caramba, disse logo que entramos que não queria resgate nenhum porque ele não planejou sequestrar ninguém então eu que ficasse com meu dinheiro e também ficasse quietinha porque o muquifo era, um tanto quanto, pequeno e ele não gosta de barulheira.

Ué. Estava fazendo o quê no Merecedor?

Não é da sua conta! Idiota.

Um dia, dois, três, uma semana, um mês e já me reconheço bem instalada no muquifo. 

Eita paz boa. Nem? Tonha. Nem? Idiota.

Mas IDIOTA mesmo continuo sendo eu que olho para o? Idiota e imagino a gente numa cama quentinha, quando quem se aquece nele é a? Tonha.

Ah...

Eu vou é continuar aqui com seu Juarez que deixa eu chorar baixinho, não manda eu lavar louça, faz miojo no almoço e jantar, traz água gelada quando eu já estou em posição de repouso na caminha de armar, é aquelas de arame puro, nem fala boa noite, olha para minha cara e vê as lágrimas silenciosas, não faz ideia nem quer fazer do porquê de tudo isso e, resumindo, seu Juarez não está nem aí para mim. Valeu seu 

Juarez. Brigadão. Brigadão mesmo.



2 comentários:

Tania Barros disse...

Ual... quero ler com mais calma, daqui a pouco!

Ana Gill disse...

Tânia, esse conto saiu em menos de 20 minutos. Estava em pane geral dentro de casa, liguei para dois amigos e pedi para me raptarem urgente. Como nem rapto, nem sequestro aconteceria, jamais, dois frouxos, sorry, sentei e pus-me a escrever.

Observe que tem alguns erros de pontuação, blá, blá, blá. Corrigirei.

Bjs e obrigada.