O caminho...

Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.


Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.

Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade

Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.

Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.

Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.

É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.

Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.

Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.

É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.

Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.

Humana sou.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Estupidez

Remexeu
Vasculhou
Optou
Nada encontrou.
Burra.



Penso na caricatura na qual me transformei.
Sou uma espécie de espelho ao avesso
Espelho esse apegado a nada.
Um nada profundo e distante de mim.

domingo, 27 de setembro de 2009

Alquimia do amor by Charles Baudelaire

Um te ilumina com ardor,
O outro te enluta, Natura!
O que diz a um: Sepultura!
Ao outro diz: Vida e esplendor!

Hermes que oculto me conquistas
E para sempre me intimidas,
Tu me fazes igual a Midas,
O mais triste dos alquimistas;

Por ti do ouro o ferro improviso
E torno inferno o paraíso;
Roubando às nuvens seu sudário,

Um corpo querido amortalho,
E às margens do celeste estuário
Grandes sarcófagos entalho.
Amor não existe
Nesse mundo cão
Feito de pedra
Coberto de sabão.
Chapada
Enlouquecida
Mestre
Nem da sua vida.




Ostenta um caminho
Ostenta propriedade
Ostenta seu destino
Rico em saudade.

sábado, 19 de setembro de 2009

Hora Grave by Rilke

Quem agora chora em algum lugar do mundo,
Sem razão chora no mundo,
Chora por mim.

Quem agora ri em algum lugar na noite,
Sem razão ri dentro da noite,
Ri-se de mim.

Quem agora caminha em algum lugar no mundo,
Sem razão caminha no mundo,
Vem a mim.

Quem agora morre em algum lugar no mundo,
Sem razão morre no mundo,
Olha para mim.


(Tradução: Paulo Plínio Abreu)

a b c






Palavras destiladas
Palavras vazias
Palavras soltas
Nuas, cruéis e frias.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Até

Doce mentira


Fincastes em meu coração
Um punhal aceso
Da cor do ouro, dourado
Com ele formastes
Nosso vínculo sagrado.

O que é isso?

Bule de água
Bule de café
Bule de chá
E o mundo remando contra a maré.

Desafio

Há prestígio
Começou o horror
Também a vingança se apresentou.

Vazio destilado
Pequeno, não doado
Infeliz entristecer.

Segue, avante
Um dia esquece
Um dia há de esquecer.

Merda

Há um copo
Há mais uma taça
Há outro garoto
Perdido na praça.

Cansaço bom

Felicidade de fato é boato
Assim como o amor
Um abrigando o outro
Enquanto lastimam o rancor.

Erro

Erro
Errado
Errante
Comigo
Contigo
Berra
O berrante.

Mundo esgotado

Mundo esgotado
Com um deus protetor
Nas ruas as crianças
Soltas, famintas, largadas
Sem luz
E sedentas de amor.

Oi

Menino

Menino grande
Garoto pequeno
Menino homem
Garoto que vem
Garoto que some.
Chegou a hora
De dizer adeus
Tu ficas com tuas convicções
Que eu vou ao encontro das minhas solidões.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Sorry III





Sinto muito
Não consigo elaborar
O que sinto por ti é medíocre
Deixa-me em meu devido lugar.

Moça bonita


















A moça é nova
A moça é bonita
De cachaça se embriaga
E segue pelas calçadas
Ternamente acalantada
Pelo prazer de ser
O que seu desejo a fez querer.

A moça reconhece que não é
A mais cobiçada da platéia
Não liga, pisa firme e continua
Acalantada pelo ópio e aturdida.

Esperta, reprime as pedras duras
Enquanto murmura às escuras
- Sou eu, sou eu, sou eu.

É noite

















É noite. O dia já se foi. Penso numa procura.
Não sei bem do que se trata
E através da minha imaginação
Vou em busca de algo que me faça
Derreter o aço que se apossou do meu coração.

Sei que a tentativa poderá ser em vão
Afinal com correntes grossas travei meus sentimentos
Não sinto mais amor
Não sinto mais bem querer
Não tenho desejos
Não tenho sonhos
Vivo sozinha da minha pequena assombração.

É noite
Vou correndo para não me atrasar
Mesmo assim chego depois do início
Fico num canto a observar
Os doentes no precipício
Rogando não sei bem o que
Como se dessa forma
Alguém fosse lhes querer.

É noite
Não me peçam para ficar
Saio agora
Adeus.

Desencantamento


















Entraram afoitamente e esquadrinharam sua casa
A moça não gostou ficou brava
Tiraram tudo do lugar
Onde outrora a moça colocara.

A moça ficou irancuda
A moça espezinhou
Com o que executaram
Com a dor que os cegos lhe causaram.

Vasculharam sua casa
A procura de um pouco de amor
Após examinarem tudo
Nada encontraram.

Olharam as paredes
Sentiram tristeza e dó
A moça novamente ficou brava
Não quer piedade nem pena
Quer apenas viver
De sua íntima e famosa cena.

- Sua vida de faz de conta - .

Veia

Ainda saboreio o encanto no teu olhar, mesmo que irreal e distante.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Medo

Os amantes


















Os amantes caminham pelos parques
De tão enamorados seus corpos balançam
São os movimentos do amor.

Os amantes mantêm-se acordados
Varam noites, escorregam nos dias
Mas não perdem tempo em desfrutar do amor.

Os amantes estão cegos
Não percebem que tudo não passa de ilusão
E que no final cada um seguirá seu caminho da solidão.

Adeus








A suplicação é tua e o fado é meu
Encontramos um ao outro e fomos felizes
Até que tudo se perdeu.

Saibas agora meu rapaz
Que não permitirei mais que me ofendas como fazias
Saibas agora meu rapaz que não permitirei mais que humilhes como fazias.

Nossos caminhos são diferentes
O meu reluz água límpida
Porque sou ingênua e demasiadamente crente
Porém, em ti não creio mais.

O teu reluz inadequação
Do teu peito não jorra
Sequer uma canção.

Vai-te embora
Farei o mesmo
Saia do meu caminho
Sairei to teu
Temos permissão agora
De errarmos sozinhos e separados.

Um pouco mais infelizes haveremos de ser
Você com tuas idéias brilhantes
E eu com meu jeito de ex-falante.
Também com minhas fraquezas
E meu jeito simples de acontecer.

Infelizes haveremos de ser
Cada um com seu caminho deteriorado
Nada e nada deixado de lado
Nada e nada não mais perdoado.

Seguiremos com nossos corações rancorosos
Temos uma vida pela frente
Se quisermos vivê-la
Haveremos de ser totalmente diferentes.
É um jogo de faz de conta: A gente faz de conta que ama e que acredita que é amado. Assim fazemos de conta que somos felizes. Somos mesmo é um bando de mentirosos.
Pequei. Amei um amor que não devia. Por isso sou castigada, diariamente, pela crueldade divina.
Parabéns pela tua covardia em não dares sequer um bom dia àquele (a) que passa ao teu lado.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Gill Benicio e as Palavras

Sempre gostei das palavras. Não me recordo muito bem quando comecei a carregar o Aurélio na bolsa. Sei que faz um bom tempo. Hoje ele está guardado numa mesa no meu quarto porque o dicionário virtual chegou, mas não me desfaço do meu primeiro Aurélio.
Lembro bem que tinha receio de que alguém me perguntasse algo, como o sinônimo ou significado de uma palavra, e eu não soubesse responder. Ficava doida só em pensar. Quando isso ocorria recorria ao livrinho, claro. Portanto, ele sempre esteve ao meu alcance.
Mas, também lembro-me de apreciar as palavras.
Ou no livreto ou no pensamento elegia a palavra mais bonita, a mais feia, a mais estranha, a mais difícil, a mais forte, a mais apropriada – são poucos os que sabem apropriá-las adequadamente. (Desculpe, mas é a mais simples e pura verdade. Eu e você sabemos disso).
Meu pensamento ficava viajando nas letras, sílabas, no ritmo, na sonoridade, e nas rimas. Nossa, eu já pensava em rimas não sei desde quando. E música então. Consumia as letras – ainda consumo - Nunca deixei escapar uma frase sem eu entender, nem que para isso tivesse que voltar o vinil cem vezes até ter toda a letra no papel.


Comecei a escrever na adolescência sem nenhuma pretensão. Passei minha vida adulta distante do mundo das letras. Reencontrei-me nas linhas aos quarenta e poucos anos de idade. Reencontrei-me pura, sábia, simples, profunda, mágica nas rimas e, principalmente, verdadeira.


Não omito um pensamento nem guardo para mim o que quer que seja. Coisas que passam pela minha cabeça, páram no meu coração e voltam à minha cabeça, sem dividir com as pessoas.


Quanto às pessoas lerem ou não é outra história. Sei que dividi meus escritos de forma equivocada. Não o fiz de forma certeira. Meu público ainda é muito pequeno. Espero ampliá-lo. Desejo mesmo. Não me sinto prepotente admitindo que posso ser lida e admirada por muitos e, claro, também ignorada por outros tantos, afinal esse poder, abençoadamente, a liberdade nos propicia.


Te aguardo não sei quando, não sei aonde. Mas sei que nos reencontraremos.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

By Jean-Paul Sartre

"O poeta sente as palavras ou frases como coisas e não como sinais, e a sua obra como um fim e não como um meio; como uma arma de combate."

by Graciliano Ramos

"Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas
com a Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos
estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei,
ainda nos podemos mexer".

Os amantes by Julio Cortázar Tradução de José Jeronymo Rivera

Quem os vê andar pela cidade
se todos estão cegos?
Eles se tomam as mãos: algo fala
entre seus dedos, línguas doces
lambem a úmida palma, correm pelas falanges,
e acima a noite está cheia de olhos.

São os amantes, sua ilha flutua à deriva
rumo a mortes na relva, rumo a portos
que se abrem nos lençóis.
Tudo se desordena por entre eles,
tudo encontra seu signo escamoteado;
porém eles nem mesmo sabem
que enquanto rodam em sua amarga arena
há uma pausa na criação do nada
o tigre é um jardim que brinca.

Amanhece nos caminhões de lixo,
começam a sair os cegos,
o ministério abre suas portas.
Os amantes cansados se fitam e se tocam
Uma vez mais antes de haurir o dia.

Já estão vestidos, já se vão pela rua.
E só então, quando estão mortos, quando estão vestidos,
é que a cidade os recupera hipócrita
e lhes impõe os seus deveres quotidianos.

Enlouquecer ou esse homem esquecer















Intenta, articula, inventa
Uma forma, um jeito, uma possibilidade
Procura um meio, um caminho, uma maneira
De rapidamente satisfazer sua vontade.

Arrancar da mísera mente
O amor que por esse homem
Na pele e nos pelos sente.

Vê na loucura o princípio, sua semente.
Pensa em sair correndo
E depara-se com a presa, a corrente.

Não encara mais o que sente
É triste, sozinha e carente
Submeteu-se a grandes desaforos
Agora procura outro lugar, outra hora
Talvez, assim, possa apagar da memória
A simples e estranha história.

Desejo
















Despertou pensando nele
No bem que ele lhe propicia
No resguardo que ele lhe oferece
E na cama em que ele a sacia.

Recordou dos movimentos intensos
Ocorreu-lhe o frenesi embriagado
A barriga suada, os músculos cansados
O bem querer de um a amar o outro
Dois amados.