O caminho...

Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.


Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.

Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade

Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.

Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.

Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.

É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.

Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.

Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.

É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.

Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.

Humana sou.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Perdão João, perdão

Sabe João
Quisera eu poder contigo repartir
Ao menos a metade do que se passa por aqui
Por dentro e também por fora de mim

Sabe João
É tanta dor
É tanta aflição
É tanta amargura
Tanta desilusão
É tanto medo
Tanto anti-perdão
É tanta maledicência
E o mínimo que se espera de si mesmo:
- Porção alguma de compreensão.

Sabe João
Essas coisas todas que ocorrem comigo, em mim
Não me permitem, não, não permitem não
Não facilitam, não, não facilitam não
Que eu mais uma vez
Venha a no espelho me olhar
Para conta de mim voltar a dar
E quanto à vida lá fora replicar.


Então João
A mim eu também me perdoar
E de mim eu também reconhecer
Sabedora de que sou eu essa mulher
Desse jeito, assim mesmo
Sabedora de que sou eu essa mulher
De pouco ou quase nenhum freio
Sabedora de que sou essa mulher
Desse jeito, assim mesmo
Teimosa em intentar ir rápido
A qualquer um, qualquer lugar
Teimosa em caminhar bem devagar
Quando se trata de algo de mim
Que eu ainda poderia extrair
Quando se refere a algo que em mim
Eu ainda conseguiria somar em vez de subtrair.


Não João
Nem mesmo assim
Não João
Nem mesmo desse jeito
Eu consigo me reencontrar
Não me enxergo aqui
Também não me vejo lá
Enfim, para mim, não estou
Em nenhum lugar
Afinal, em se tratando de mim
Tudo gira bem, como disse, bem devagar.


Mas, não João
Não posso não
Passar agora para ti
Isso que de encontro veio e vive em mim.


Não João
Não posso não
Falar agora para ti
Sobre isso que continua a se alastrar
E toma conta de mim por completo
Como se eu fosse nada mais
Alguém sem hora e sem lar. 


Mas, não João
Não posso não
Agora contigo dividir
Pois, sozinha tenho que confrontar
Todos os meus devaneios
Pois, sozinha tenho que encarar
Todos os meus receios
Pois, sozinha tenho que enfrentar
Todos, esses tantos, meus medos.


Sabe João
Mesmo que ainda seja necessário eu recorrer
A todos e quaisquer tolos meios.


Mas João
Sozinha eu preciso ir
Para de mim eu própria não sucumbir
Sozinha eu preciso ir
Só assim não haverei mais de permitir
Que as minhas aflições
Consigam de novo me quebrar
Consigam novamente me repartir. 


Sabe João
Sozinha eu tenho que enfrentar
Tudo que está por aqui
Sozinha eu tenho que enfrentar
Tudo que está para mim em todo lugar.


Eu sei João
Isso que todos mencionam ser tão visível
Porém, em meus olhos
Soa e ressoa oculto e aflitivo.


Mas sabe João
Como poderia eu enxergar
Essa coisa abstrata e feroz
Intitulada já por mim
De meu fiel e diário companheiro
O medo.


Sabe João
De mim ele não abre mão
De mim ele não larga não
Não tem trégua alguma
Também não tem não
Piedosa compaixão.


Sim João
Ele está aqui em mim
E para mim disponível sempre está
Toda e qualquer que seja a hora
Em todo e qualquer que seja o lugar.


Sim João
Se eu não for sozinha
Bem sei que não terei
Como meu perdido eixo reencontrar
E retornar ao que ainda é meu direito
Nosso acanhado lugar.


Não João
Não posso não
Ter ciência de que tu sabes
De todo esse o meu mal
Esse que há anos habitou meu organismo
E pôs-me de joelhos
Para sempre de castigo.


Não João
Não posso não dividir contigo
Isso que em mim continua a se alastrar
É com esse isso que eu vivo
A brigar, bradar e raivar.


Sim João
De ti ainda preciso nesse momento
Algo que sempre foi e ainda vai além
De ti ainda preciso nesse momento
Que mantenhas assim a tua mão
Estendida em minha direção.


Sim João
Que ela, a tua mão,
Esteja sempre ao meu alcance
Como sempre se revelou
Se foi por acaso ou se foi por amor
Se foi por nobreza ou se foi por generosidade
Não importa
Tua mão a mim comporta.


Então João
Quando a simetria eu recobrar
Será nesse momento
Que à vida eu retornarei
De cara e em primeiro lugar
A tua mão eu pedirei
Para que junto comigo
Tudo isso nós possamos
Por fim enterrar.


Mas, João
Mesmo após isso feito
Continuarei eu a com ela contar
Com a tua mão
Como sempre assim foi, desde então!


Viu João
A ela eu voltarei a me prender
Será nela que vou de novo me agarrar
E meu corpo e alma juntos, eu e você, suster.


Sim João
Somente dessa maneira
Poderei eu em mim
Fazer-me continuar
Pois, mesmo por mim sozinha reencontrada
Do teu abrigo nunca haverei de não necessitar. 


Sim João
Tu que caminhas sempre na via expressa
Enquanto eu, tua mãe, sempre em dúvida
E conhecedora apenas do caminho contrário
O caminho da contra mão
Essa assim como eu duvidosa e similar.


Por fim João
Algo tenho a te revelar: - Quando em vinte e quatro de maio de mil novecentos e oitenta e seis, sim, no dia em que eu te pari, não fui eu quem te deu a vida e sim foste tu quem doou de volta vida para mim.


Por enquanto João
Por tudo isso
Peço-lhe agora meu filho
Peço-lhe agora meu lindo menino
Agora e por hora
Frente ao redentor e de joelhos:
- Perdão João, perdão.


Sim João
Perdão por tudo que a ti e em tua vida
Possa eu com meu jeito ter danificado
Perdão por tudo que a ti e em tua vida
Possa eu com meu jeito ter afetado.

- Perdão João, perdão.












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