O caminho...

Intento, ainda acanhada, entregar-me às letras, sílabas, palavras, frases e o que se pode obter dessa junção. Coisa linda a mistura das palavras.


Sempre fui encantada pela nossa Língua e tive a oportunidade de ter como mentora, na antiga quinta série, a professora de LP Maria Alice.

Seu saber e envolver a todos nós, seus alunos, fez-me, literalmente, apaixonar-me por uma mulher aos onze anos de idade

Paixão platônica, pueril, inocente e verdadeira. Nascida da admiração do saber e ir além fazendo os outros também participarem desse conhecimento espetacular, quanto se trata de se entregar à Língua Portuguesa.

Vivo pelos cantos, tanto internos quanto externos, de caderneta em punho e caneta entre os dedos. Do nada, vejo uma imagem ou ouço uma palavra perdida num bar e dali parto para uma história vinculada à alguma vivência minha, da infância difícil até a executiva promissora, e me abro para o mundo das letras.

Meus dedos percorrem rapidamente a caderneta anotando o que me for possível trazer à tona, num momento posterior, de pura entrega, dedicar-me a misturar palavras, ritmos, sentidos, além, de uma boa dose de singularidade.

É assim que construo sem pressa meus poemas, versos, sonetos, também minhas crônicas, prosas e contos.

Foi a poesia que me salvou de me destruir na minha mais pura e insólita melancolia.

Foi a poesia que me salvou de mim mesma, impediu que eu ultrapassasse a linha da imaginação e fosse para algum lugar nunca antes visitado.

É a poesia, o verso, a magnitude da construção literária que me mostram quem realmente sou.

Oras posso valer até um milhão, mas sei tão bem que não valho sequer um tostão.

Humana sou.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Propósito


















Sonhe.
Aqueça-te em teus pensamentos
Abrasa-te em torno de tuas idéias
Vive teu amor platônico e
Na alegria ou melancolia, sacia-te.

Mas, por favor, não espera
Aperto de mão, beijo ou abraço apertado
Muito menos príncipe encantado
Lembra quando mamãe lhe disse?
O príncipe se mudou
E endereço não deixou.

Sendo assim, só lhe resta cultivar
O amor platônico que brotou
Do teu insensato olhar.

Prestamento


















Ninguém ouse lhe dizer
O que já sabe saber
Ninguém ouse lhe informar
O que já reconheceu condenar.

Mora num lugar distante
Vive sem prestação
Deve somente a uma senhorita
Uma breve explicação.

Fez, um dia, com que ela chorasse
Sua ausência, sua partida
Deixou no peito da moça
Uma grande e cruel ferida.

Não se envergonha de ter medo
De voltar e a moça encontrar
Então, dizer-lhe de coração
Que seu percurso infelizmente
Não comporta ninguém não.

Sendo assim, diante de sua covardia
Estabeleceu uma sentença para si
E relembra-a todos os dias
- Longe ficarei.
Longe dela para sempre estarei.

Esse foi o caminho adotado
Pelo homem, pequeno coitado,
Para esquecer que um dia
Foi imensamente amado
Por uma moça que dele se gabou
Mas não conseguiu seu caminho contrapor.

Legítimo

Quando ele nasceu
O ar a alegria percorreu
Diante do pequenino menino
A terra quase estremeceu.

Ele e ela eram felizes
Ele e ela se amavam
Porém haviam cicatrizes
Permeando do bebê a origem.

Era de outro
Nunca negou
Sempre disse
Relembra o dia
Em que afirmou.

Ele tenta
Ele intenta
Fazer-se de rogado
Mas no fundo
Há um coração machucado.

Faz um esforço homem
Precisas pensar
Precisas lembrar
Que tu o criarás
E teu ele será.

Faz um esforço homem
Tira do rosto esse véu
Para que persistir na escuridão
Se enquanto isso o menino para ti é só emoção?

Faz um esforço homem
Olha esse sorriso
É teu
Ele em sua pureza te deu.

Faz um esforço homem
Para viver a realidade
Deixa de lado
Essa maldita piedade.

Tens agora teu bebê
Ele tu farás crescer
Pelas noites o embalará
E de amor há de perdoar.

Isso mesmo homem
Ninguém vive do legal
Na vida real
O que vale como reza
É o legítimo que se prega.

Acorrer


















Não sei mais o que dizer
Firmar ou, quem sabe, estabelecer
Como alternativa me impus uma decisão.
Que chamarei de regra para sustentar a ação.

Regras a cumprir
Que diminuirão minha sentença
Regras a cumprir
Que sumirão com minha presença.

Preciso urgentemente dessa casa escapar
Sairei correndo
Vou em busca de outro caminho
Preciso urgentemente dessa casa escapar
Tardiamente esse canto necessito desabitar.

Vou agora
Não pararei para pensar
Sei que ficando aqui posso morrer
Não há ar para respirar
Não há água para tomar
Não tenho mais um amor para amar
Então para quê ficar?

Vou agora.
Digo adeus ao pesadelo.
Vou agora.
Digo adeus ao homem que por décadas me tolheu.

Adeus, adeus e adeus.

Choro de coração

O coração está triste
O coração chora pelo amor que partiu
O coração está triste
O coração chora pelo sorriso que para ele não se abriu.

sábado, 13 de março de 2010

Tristeza


















Sentimento
Frustração
Eloqüência
Tudo em vão.

Perdão
Sacrifício
Início
No primeiro
Precipício.

Vai
Arrasta-te pela rodovia
Esfrega tua cara no chão
Quem sabe assim possa se livrar
Da tua fiel agonia.

Quem sabe assim possa um dia
Sorrir, sorrir e sorrir.

Massacrado

Nunca páre na frente do seu portão e fique esperando com que ele magicamente se abra.

Pregaram que tu és leso, por isso não tem as chaves.

Acordaram que tu és tolo, por isso só podes entrar quando o portão alguém de abri-lo se encarregar.

És chamado de bobo.

És denominado coitado.

Reconheça tua insignificância e

Permaneça ausente

Diante de tua frágil mente.

Inferno





Há a casa do horror
Há a casa do pavor
Há a vida dissolvida em água suja
Há a morte ao seu dispor.

- Obrigada
- De nada.

Gratidão

Se por algum motivo esperas gratidão daqueles que passaram pela tua vida e, também, dos que ainda passarão sugiro que esqueças teu desejo de reconhecimento.

Talvez seja mais fácil encontrar gratidão num outro planeta porque aqui na Terra a gratidão foi esquecida há tempos.

Em seu lugar instituíram o individualismo e o egocentrismo.

Sinto muito lhe dizer isso.

Casa Rosa





Há uma casa rosa construída bem no meio de um jardim
Todos que a olham gritam em coro:
“- Dindindim, dindidim, dindindim
Quero uma casa rosa pra mim”.

Auto-piedade





Saibas agora de verdade
Encontro-me perdida na auto-piedade.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Tola













Desce do salto mulher
Pelo menos uma vez
E vê se enxerga
A merda que tu fez.

Lástima





Brinca criança no terreno baldio
Playground não foi feito pra ti
Que carrega um bucho vazio.

Oposto





Isso mesmo
Segue tua contramão
Nada há para ti
Na outra direção.

Origem


Olho fechado
Olho aberto
Braço riscado
Mão de concreto.

Passeia firme em busca das palavras
Sabe que há
Um distante lugar
Onde tudo que se diz
Representa sua real matriz.

Incredulidade














Há um mundo
Há um fiscal
Girando em volta
Dos que pagam pela vida mal.

Casas de alvenaria
Empobrecidas, as de madeira
Virgem maria
Como isso aconteceu?
Como foi que nisso
O mundo se perverteu?

Dizem que há justiça
Penso que se ela realmente existe
Há tempos foi extinta
Por aqueles que torturam
Gente sábia, gente carente, gente pobre e gente doente.

Virgem maria,
Como posso eu na justiça acreditar?
Somente se for para dela
Rir, gargalhar e gargalhar
E ansiar desse mundo
Rapidamente me afastar.

Virgem maria, tens algo a me dizer?

terça-feira, 9 de março de 2010

Descaminho


















Prisão
Preguiça
Morte
Mortiça.

Através da porta de ferro
Ela seguiu e conseguiu
O inferno adentrou
Nele se estabeleceu
Ele seu novo mundo elegeu.

Fraude



















Faço
De fato
O ato
Caro.

Pago
O preço
Com dinheiro
Não me peça
Não tenho
Endereço.

Circulo
Limpo as sobras
Lavo as mãos
E ando um pouco mais
Pelo salão.

Perambulo
Reparo num intruso sem cor
Desfalcado
Abraçado a uma bengala escura
Encostado ao quadro
Rente à moldura.

Enquanto isso penso que brilho
Enquanto isso penso que sou purpurina
Enquanto isso penso que cintilo
Até acordar e perceber
Que tudo não passou
De mais um sonhar que findou.

domingo, 7 de março de 2010

Abnegação


















Ora sentada num canto da sala
Ora próxima à pia da cozinha
Ora estirada no chão
Ora largada sobre o colchão.

É quando, nesses momentos, repassa em sua memória
A árdua, mas assentada decisão
Cravada, em consciência, no coração:
- Abnegação.

sexta-feira, 5 de março de 2010

União





Sorria
Afinal hoje é o teu dia
Logo logo te casarás
E ao lado do demônio
Para sempre acordarás.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Perdão

Cegueira


















Agora
Lá fora
De frio
Alguém chora
Enquanto noutro canto
Alguém clama
Algum mantimento
Para se alimentar.

Mas espalhada se encontra
Espalhada pelos arredores está
A desgraça do sofrimento
Vivenciada por tantos
Demonstrando o resultado
Da cegueira coletiva que se estabeleceu
E dia a dia cresce
Para outros adotarem
Sem misericórdia
Distante do que se chama amor
Ausente do que alguém pregou um dia "amai-vos uns aos outros".

Despedimento


















Ouço atenta o que me dizem ao telefone
Não emito nenhuma palavra
Não tenho nada a dizer.

Desligo mecanicamente o aparelho sem me despedir e caminho até o quarto.

Abro o armário e escolho um vestido
Entre tantos fico na dúvida.

Opto por um de meia manga na altura dos joelhos
Cor sóbria, cinza escuro, tecido de malha
Ótimo. Não precisa passar.

Estico-o sobre a cama e busco um calçado adequado.
Melhor não ser muito alto
Sei que vou andar bastante
Encontro o par ideal para compor meu último visual para ele que não perceberá o tom das minhas vestes nem o meu cabelo preso.
Pior, não sentirá o perfume que tanto apreciava e que oportunamente usarei.

Dirijo-me até o banheiro
Arranco a roupa e jogo-a no chão
Abro o chuveiro e enfio-me debaixo dele
Deixo que a água encharque meus cabelos
Deixo que a água umedeça com certa força minha pele
Sinto-me mais consciente agora
Como dizem por aí a água esfria a cabeça
Penso um pouco sobre nossa história
Relembro algumas passagens
Pareço que ouço sua voz em meus ouvidos
E sinto um leve arrepio no meu corpo.

Não entendo bem o porquê
Não sei o que ouvi, apenas reconheci o tom.
Relembro algumas vivências
Dois em um
Um em dois
Profundo
Extenso
Vivido quase que na plenitude do entendimento que se pode querer viver com alguém.

Esqueço.
Paro com os pensamentos e lavo bem os cabelos.
Depois de banhar o corpo enxugo-me com certa raiva.

Como posso nesse momento passar por esse ritual todo sabendo o que virá pela frente?

Como sempre não deixo de passar creme nas pernas, nos braços e no rosto.
Penteio os cabelos e prendo-os num coque. Deixo que o aroma do meu perfume toque suavemente minha pele.

De volta ao quarto busco na bolsa o rímel e o pó.
Passo no rosto e resolvo também usar um pouco de blush, afinal ando tão pálida.

Enfio-me no vestido, calço os sapatos e acendo um cigarro.

Sento-me na beirada da calma. Nas mãos seguro os meus óculos escuros.

Não sei direito o que vou fazer lá
Não sei direito porque vou.
Apenas sinto a necessidade de ir vê-lo mesmo sabendo que o tempo não voltará nem fará com que nada seja diferente do que foi e do que será daqui pra frente.

Levanto-me com certa pressa. Na sala pego as chaves do carro. Já no elevador lembro-me que esqueci meus cigarros. Paciência.

Dou partida. Vou a sessenta por hora, sem pressa, sem lágrimas, vazia. O único sentimento que reconheço em mim nesse momento é o de insatisfação. Não vasculho entender. Dou-me uma trégua e respiro fundo.

Paro no local indicado. Desço. Ando vagarosamente até encontrar a sala que me foi informada.
Lá estão reunidos tantos conhecidos. Não aceno nem cumprimento ninguém.

Caminho até a mesa que me parece fria e olho como o estenderam sobre ela. Seu corpo jeitosamente adornado pela madeira.

Tenho vontade de tocar-lhe o rosto.
Tenho vontade de dar-lhe um beijo, mas não faço nada.
Apenas observo.

Noto o pequeno alvoroço. Trata-se da família.

Não rezo nem penso em nada que poderia lhe dizer.

Fico ali parada por alguns instantes imaginando apenas a solidão que me espera.

Ninguém se aproxima de mim. Melhor assim. É como se existisse de forma velada um pacto de respeito ao comportamento de todos perante essas situações.

Passo a mão pela mesa. Úmida. Um pouco de poeira.

Nesse momento minha mão busca as mãos dele. É quando sinto no rosto uma lágrima que teimava em cair.

Dobro-me e beijo-o escandalosamente por alguns minutos. Tenho esse direito. Beijo-o com paixão e já com saudades.

Quando me ergo reparo que alguns me olham de forma piedosa e o sentimento de tristeza se intensifca.

Resolvo que devo voltar para casa. Preciso me deitar. Talvez dormir um pouco. Talvez chorar um pouco.

Viro-me e encontro o percurso até a porta de saída.

Já no carro dou partida. Não sinto meus movimentos. Apenas repasso-os.

O caminho de volta parece mais demorado e ouso ouvir uma música.

Em casa troco a roupa. Boto meu pijama. Bebo um copo d’água e estendo-me debaixo do edredom. Janela fechada. Luzes apagadas.

Peço mentalmente que o sono venha me encontrar. Nos sonhos vejo apenas ele caminhando pela sala procurando um cd que há tempos não ouvia e que não sabe aonde colocou. No sonho vou ajudá-lo na sua busca e encontro. Fico feliz por ele e fico feliz por eu ter achado.

O jantar já está pronto. Foi ele quem fez. Sentamos à mesa e comemos falando algumas besteiras e rindo um pouco. Ao fundo, a música.

O sonho vai embora e acordo entusiasmada. Recheada de momentos vividos. Recheada de momentos únicos. Vou até a sala e coloco no aparelho de som o mesmo cd que ouvimos juntos tantas vezes.

Olho pela janela e vejo que o sol está indo embora.
Olho pela janela e entendo que o sol está indo embora.
Olho pela janela e choro desesperançada sua partida.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Vasta solidão

Em meu corpo se infiltrou
Uma soberana solidão
Dominou por completo
Minha mente e coração
Não arreda pé
Guia-me pela mão.

Minha Morte






Passeio pelo parque
Vou de costas fingindo que nada vejo
Procuro apenas uma rosa amarela
Ela será a dama que me fará
Companhia na minha morte singela.

Desacreditou

Sonho sonhado
No peito guardou
Para no momento oportuno
Lançá-lo ao ar
Junto com ele também despejará
O amargo sabor que ficou.

Hipocrisia

Carrego no coração
Um insensato pedido de perdão.

Doutrina


















Paga sua penitência
Frente à escada velha de tom dourado
Existe sem arcar com aluguel
Encontra-se num canto
Forrado de papel
Sobrevive a quase tudo
Reza calado, mudo
Não sabe diferenciar
O que é oração
Do que se chama rezar.

Não crê
Na multidão que vê
A penar sem sentido
A remar de olhos vendados
E com os ouvidos travados.

Jura que se talvez possa
Na imprecisão da vida
Um dia se apaziguar.

Assim, levará adiante
Intentará
Mesmo com o coração já enfraquecido
Pelo cruel resultado que se deu
A todos que a terra absorveu
Como homem serenizar.

Decisão

Quando o céu estrelado avistou
Instantânea ao amor renunciou.

Tarde demais


Quando tomares ciência
E enfim parares para pensar
Darás de cara com o tempo
Que se foi para não mais voltar.

Devolução

Toma
Leva
É teu
Não quero
Esqueça
Eu sei que foi você quem me deu
Recuso
Sou leviana
Não sei nem como cuidar de mim
O que dizer então de cuidar desse amor?

Deferência










Sinto muito lhe informar
Mas não sou quem você quer
Sinto muito lhe noticiar
Mas não sou o que você deseja
Da estampa de uma mulher.

Entre nós predomina a concorrência
Entre nós prevalecem as desavenças
Isso acontece porque esperas de mim
O que não tenho a lhe oferecer, enfim.

Procures outro alguém
Deixe-me comigo no meu mundo feito de além
Manter-me-ei sozinha e animosa
Asseguro-lhe que haverei de viver
Cristalina como ninguém jamais pensou.

Sei que haverá um dia
Em que o pesar te encontrará
Há espaço no teu canto
E reservas em teu lugar.

Enquanto isso estarei distante
Vivendo da forma que sonhei
Anseio me afundar
Nas palavras que correm soltas no ar.

Creias: Assim será.